Quando
fui ao cinema, eu já sabia o que me esperava. Aliás, pensava que sabia. Na
verdade, a coisa foi muito pior.
Eu
torcia para que esse filme fosse a volta por cima dos irmãos Wachowskis.
No
primeiro Matrix, eles se revelaram como ótimos recicladores de ideias. Misturaram
simplificações de conceitos filosóficos, literatura cyberpunk e estética de
anime para criar uma mitologia consistente sobre o embate entre homens e
máquinas num futuro sombrio. Adicionem a
isso as cenas de luta lindamente coreografadas, os efeitos especiais inovadores
e os personagens carismáticos (mocinhos e vilões), e temos um dos filmes mais
importantes para a indústria do cinema das últimas décadas. Matrix foi um
sucesso de bilheteria e se tornou uma referência da cultura pop porque um grupo
de pessoas talentosas criou algo acima da média, algo para se tornar objeto de
culto. Assim como Star Wars foi em 1977. Tudo bem, Guerra nas Estrelas teve
mais impacto.
Então,
ao analisar a carreira dos Wachowskis, a ficha finalmente caiu para mim. De uma
vez por todas, eu entendi que eles sofrem de uma doença chamada “síndrome de
George Lucas”. Quer dizer,eles são uma versão piorada de George Lucas. Dos 11
longas-metragens em que exerceram alguma função de diretores, roteiristas e/ou
produtores, à exceção do primeiro Matrix, nenhum de seus filmes teve nada de
realmente positivo. Matrix 2 e 3 fizeram muito dinheiro, mas todos concordam
que são grandes decepções. E V de Vingança não foi tão bem nos cinemas e é
apenas um filme OK.
A
filmografia dos Wachowskis é uma lista, em sua maioria, de filmes fracos e de
péssimos investimentos para seus financiadores. Por sua vez, o criador de Star
Wars é um diretor e roteirista medíocre, mas é um produtor esperto, seu maior
talento é justamente gerenciar talentos, selecionar os melhores profissionais para
concretizarem suas ideias. George Lucas consegue ganhar dinheiro até com
sacrilégios como os episódios I a III de SW. Já os Wachowskis são incompetentes
até para fazer filmes ruins. Talvez toda a grana que a Warner tinha conseguido com
a trilogia Matrix foi pelo ralo nos filmes seguintes dos irmãos. E O Destino de
Júpiter talvez seja o ponto de virada desse cartaz todo que eles tiveram com o
estúdio por tantos anos.
O
novo filme dos Wachowskis falha em tudo no que Matrix triunfou. Matrix deu tão
certo porque todos os elementos da produção estavam voltados para a estória. O
filme partiu disso e o resto foi uma feliz junção de talentos, uma soma que só
fez enriquecer a mitologia daquele universo. Em O Destino de Júpiter, os
elementos de produção não “conversam” entre si, batem cabeça. Justamente porque
não há uma estória para contar. O acúmulo de erros é tamanho que não dá para
acreditar como um grande estúdio como a Warner não interveio nessa produção
para tentar consertar o estrago logo no início, ou mesmo abortar o projeto.
Diretores
e roteiristas constantemente reclamam da interferência dos estúdios nas
produções. Muitas vezes, os artistas têm razão. Homem-Aranha 3, de Sam Raimi,
foi detonado criativamente pelas imposições absurdas da Sony. Foi bem de
bilheteria, mas é um filme odiado, e isso não é bom para os negócios,
enfraquece a marca. Agora a própria Sony está tentando salvar seu bem mais
valioso no acordo com a Disney/Marvel. Mas há filmes em que é o estúdio quem
garante sua qualidade. E provavelmente muito do sucesso do primeiro Matrix deve
ser creditado ao veterano produtor Joel Silver, que convenceu a Warner a fazer
o filme e deu liberdade para os Wachowskis trabalharem, mas sempre com seu olho
experiente acompanhando todo o processo.
Certos
filmes são sucesso de público, outros são sucessos de crítica, e há os agraciados
com ambos. Mas quando um diretor faz filmes que não conseguem atingir nenhuma
das duas coisas é porque tem algo de muito errado.
Fazia
tempo que eu não conferia as horas e bocejava no cinema. O Destino de Júpiter
tem alguns dos piores diálogos que já tive a infelicidade de escutar. Fiquei
constrangido pelos atores. Que também não ajudam muito, em péssimas
performances. Ninguém se salva. Os papeis mais problemáticos são o da heroína e
o do vilão-mor. Mila Kunis foi uma escolha equivocada. E suas funções no filme
são basicamente dar em cima do personagem de Channing Tatum e ser salva por
ele. Em tempos de Katniss Everdeen, isso é um retrocesso. E o vilão afetado de
Eddie Redmayne faz a gente sentir mais pena do que medo. O roteiro não tem
furos, e sim crateras, principalmente em relação aos personagens secundários
(alguns têm uma forte presença no primeiro 1/3 do filme e depois são
simplesmente esquecidos), além de reviravoltas gratuitas e explicações de uma mitologia ridícula. O que causa a instabilidade e o caos no planeta do vilão-mor no clímax
do filme é uma solução de roteiro tão preguiçosa. É difícil comprar aquela
ideia. As únicas cenas empolgantes são as de ação, e mesmo assim elas são
confusas, o espectador fica meio perdido com tanta movimentação e cores. Os
efeitos especiais são deslumbrantes, mas vazios, não há nada que os sustente.
O
filme é brega, com sua direção de arte de escola de samba, mas fica ainda mais
brega por se levar tão a sério (aliás, os alívios cômicos aqui são muito
deslocados). Diferente de outros filmes bregas e divertidos, como Guardiões da
Galáxia, Barbarella, Mercenários das Galáxias, O Quinto Elemento e Flash
Gordon.
Finalmente,
percebi que os irmãos Wachowskis são um caso perdido. Eles parecem aqueles cantores
de um sucesso só, que continuam na estrada apenas para fazer o showbiz girar.
Ainda em 2015, eles vão estrear uma série de ficção-científica no Netflix, Sense8,
sobre um grupo de pessoas ao redor do mundo que misteriosamente ficam conectadas
mental e emocionalmente. Achei a premissa idiota. Pelo menos, os Wachowskis
tiveram a decência de não ficar mamando nas tetas do seu maior sucesso. Pelo
menos, por enquanto.
P.S.
O único filme deles que ainda não vi foi Cloud Atlas. Mas primeiro vou
terminar de ler o romance de David Mitchell.