A literatura infanto-juvenil nacional tem tradição. Ao longo
do século 20, autores como Monteiro Lobato, Dinah Silveira de Queiroz, José Mauro
de Vasconcelos, Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Pedro Bandeira e Marcos Rey foram
best-sellers escrevendo para jovens estórias que estimulavam o senso de
aventura, em tramas ora mais inocentes, ora mais difíceis, tratando de temas
como a importância da amizade, a violência urbana e o tráfico de drogas.
A partir dos anos 2000, com o surgimento de Harry Potter e
similares, a ficção para jovens ganhou um enorme impulso no mercado editorial
em todo o mundo. No Brasil, não foi diferente. Por aqui, houve autores que
quiseram tirar uma lasquinha da onda e publicaram séries muito coladas ao
fenômeno do bruxinho órfão, sem muita originalidade.
Quem conseguiu fugir da mesmice foram as autoras Eliana
Martins e Rosana Rios, criadoras da série O Segredo das Pedras.
Composta por três romances e uma peça de teatro, a série
começa, em seu primeiro volume O Último Portal, com o desaparecimento de um
famoso geólogo brasileiro, envolvido em pesquisas misteriosas sobre um possível
mundo subterrâneo. Mundo este que estaria ligado à humanidade, influenciando
muitas de nossas referências culturais ao longo da História. Dara, uma menina
colecionadora de pedras, Caio, um fã de futebol, e Safira, uma veterinária que “fala”
com os animais, são jogados em meio a essa aventura cheia de segredos a serem
desvendados e muitos perigos.
O infanto-juvenil nacional sempre teve grande inserção na
vida escolar. O que sempre gerou um certo “efeito colateral”, uma ojeriza à
leitura por parte de muitos jovens. A leitura se tornava uma obrigação. Porém a
leitura por prazer era um hábito antigo entre os jovens brasileiros, que foi
perdendo força ao longo das décadas.
Nos últimos quinze anos, a leitura espontânea entre jovens
vem ganhando corpo novamente, seja de autores estrangeiros, seja de autores
nacionais. A virada se deve ao fato de livros e séries terem protagonistas com
ideias e comportamentos muito próximos de seus leitores, de seus fãs. São
protagonistas que vivem grandes aventuras, mas que ainda assim são inseguros, falhos
e que desconhecem suas próprias qualidades.
A literatura infanto-juvenil nacional amadureceu por tratar
o jovem de forma mais complexa. Nossos autores do passado divertiam, mas eram
raros aqueles que entendiam o jovem.
No caso de O Último Portal, suas autoras conseguem fazer
isso em parte.
A maior qualidade do livro é o texto em si. Ele é muito bem
escrito. A palavra certa sempre no lugar certo. Pena que a construção dos
personagens não acompanha essa excelência. Tantos os protagonistas como coadjuvantes
e vilões não têm o pathos necessário para que o leitor se importe com eles. Lemos
o desenrolar da trama sem maiores expectativas. Queremos ver como termina a
estória não para saber do destino de cada um, mas para confirmar se as autoras
encerram esse primeiro volume de maneira satisfatória ou não, para ter uma
ideia do todo.
Outra qualidade da obra é o cuidado na criação da mitologia
da série, envolvendo vários aspectos do “mundo mineral”. Foi elaborada até uma
língua do mundo subterrâneo, com direito a glossário. Além de expandir o escopo
da trama para outros países e culturas. Afinal, se algo tão grandioso
acontecesse apenas em um único país, apenas no Brasil, não teria o mesmo
efeito.
Quero ler os outros volumes da série, na esperança de que
ela evolua, de que os próximos livros sejam excelentes em todos os aspectos.
O Último Portal, de Eliana Martins e Rosana Rios, 272 págs.,
Cia das Letras.
AVALIAÇÃO: BOM.