terça-feira, 27 de maio de 2014

O DIÁLOGO (CONTO)


Se eu previsse o que estava por vir, talvez não desse falta do Maigret que devorava de manhã na cama, e que segui lendo na praça de alimentação do shopping, enquanto esperava Cristina. Talvez não lembrasse que o havia deixado em sua bolsa quando nos encontramos para almoçar, porque eu estava de folga e não queria carregar nada nas mãos. Talvez não quisesse saber logo quem matou o Senhor Charles. Talvez não fosse ao trabalho de Cristina para pegar o livro. Só que não acredito em vida após a morte, destino ou premonições. O que acontece, acontece.

Cristina é vendedora numa loja de roupas. Enquanto eu atravessava os corredores do shopping, driblando um e outro, não parava de pensar no programa que ela tinha inventado para aquela noite. A despedida de um amigo dela. O sujeito vai morar em Portugal. Não suporto a maioria de suas amizades. Riem muito alto, falam muita merda. Assim como eu sei que ela não suporta a maioria das minhas. Para ela, são um bando de boçais.

Entro na loja e Cristina logo me vê. Ela se mostra mais surpresa do que contente. Ela quer saber o que estou fazendo ali. Digo que vim atrás do livro que deixei em sua bolsa. Ela vai pegá-lo. Na volta, confirmamos o maldito programa da noite. Trocamos um selinho. Saio da loja disposto a terminar o romance ali mesmo, num canto menos barulhento do shopping.

Dois corredores depois, meu plano foi frustrado. Eu estava distraído e só fui perceber quem era tarde demais, quando já olhávamos um para o outro. Não sei por que paramos, frente a frente. Não sei por que não seguimos nossos caminhos.

Ela estava com o cabelo curto, deliciosamente gorda e acompanhada de uma menininha e um sujeito alto.

Como vai?, ela disse, serena. Ela tinha reagido rápido ao susto.

As palavras quase não saíram da minha boca. Minha recuperação não foi imediata. Fiquei com cara de idiota por mais tempo.

Ela me apresentou ao marido e à filhinha.

A conversa não rendeu muito. Ela perguntou por minha família. Em seguida, instalou-se um silêncio constrangedor. Nos despedimos.

Fui direto para o carro e joguei o Maigret no banco do carona.

Tomei fôlego para não dar ignição de uma vez e arrancar com tudo.

No primeiro sinal vermelho, apareceu um menino me pedindo um trocado.

Eu não tenho nada, disse a ele, tentando ser gentil ao invés de usá-lo como bode expiatório da minha raiva, da minha frustração.

Ele segurou o passo, olhou para mim e deu uma gargalhada, erguendo a cabeça, depois seguiu andando.

O sinal abriu, fui embora.
                         
(Conto vencedor do 1º lugar do concurso Exercícios Urbanos, promovido pelo site Portal Literal, em setembro de 2006)

segunda-feira, 26 de maio de 2014

BATMAN MEDIEVAL

O fotógrafo britânico Adam Jay vem chamando atenção por suas fotos com personagens de quadrinhos e de videogames. São representações fiéis em carne e osso de heróis, principalmente, da Marvel e da DC. Ele também mostra variações desses heróis. Como essa versão medieval do Cavaleiro das Trevas. Num universo paralelo, poderia muito bem existir um certo lorde britânico, chamado sir Bruce Wayne, que faria justiça com as próprias mãos para vingar a morte dos pais, lorde Thomas and Lady Martha.










 

sábado, 17 de maio de 2014

UM CORPO ESTRANHO NA LITERATURA BRASILEIRA


Para tristeza de seus leitores, Moacyr Scliar faleceu em 2011. Ele era um autor peculiar na literatura brasileira. Ele não se interessava muito pelo realismo, tão caro a tantos autores nacionais. O escritor gaúcho faz parte de um time em que a imaginação é o elemento mais importante da narrativa. Outros craques são Murilo Rubião, José Cândido de Carvalho e J.J. Veiga. Todos eles fazem uso do chamado “realismo mágico”. Aqui o dia-a-dia é invadido por acontecimentos estranhos, sempre colocando o ser humano à prova.

Em A Mulher que Escreveu a Bíblia, Scliar tece uma divertida reflexão sobre a condição da mulher. O mecanismo narrativo é simples e ao mesmo tempo engenhoso. Uma mulher nos dias atuais procura um especialista e faz uma regressão a uma vida passada. Volta-se no tempo, à época de um personagem da Bíblia, o rei Salomão, que teria governado no séc.X a.C.

Moacyr Scliar
O texto é delicioso pela força da protagonista, ora delicada e profunda, ora desbocada e irônica. O tom é coloquial, mas um coloquial dos dias de hoje. Soa estranho, mas é também curioso ouvir um personagem narrando acontecimentos ocorridos há três mil anos de forma tão ágil, com gírias e expressões atuais. É um recurso válido, pós-moderno, diriam alguns, mas que, acima de tudo, condiz com as intenções do autor. Afinal, ele nos fala sobre uma mulher do passado para, justamente, pensarmos sobre as mulheres do presente.

Pode-se dizer que o livro é feminino. Consegue captar bem a personalidade de uma mulher que precisa se fazer forte para superar sua fragilidade, o que a coloca em constante conflito com ela mesma. Ceder ou não ceder, eis a questão para ela. Ser mais submissa e ter uma vida mais confortável, ou ser mais aguerrida e procurar uma plena felicidade, que talvez nunca chegue?

O livro tem ótimo ritmo e nunca é chato. O autor nos reserva até uma trama de suspense na parte final. Agora, quanto ao final propriamente dito, Scliar deu uma escorregada feia. Um romance que se mostrou tão perspicaz em querer entender a mulher poderia ter terminado melhor. Leitores podem até acusar o autor de machista. Tirou um pouco do brilho de tudo que veio antes. 

A Mulher que Escreveu a Bíblia, de Moacyr Scliar, editora Cia das Letras

AVALIAÇÃO: MUITO BOM

domingo, 11 de maio de 2014

O FUTURO DA HUMANIDADE?

True Skin (2012) é um curta que se passa num futuro não muito distante, onde a modificação ciborgue está na moda. O protagonista, Kay, não pode pagar suas modificações nos EUA. Então, ele recorre ao mercado clandestino em Bangkok. Quando um misterioso e revolucionário chip cai em suas mãos, ou melhor dizendo, vai parar em seu corpo, Kay tem de fugir de forças perigosas.




quinta-feira, 8 de maio de 2014

ODE AO OVO FRITO (POEMA)


    Quem vem primeiro
    não é a galinha assada,
    é o ovo frito.

    Parece tanto com o sol,
    quando na frigideira
    crepita,
    reagindo ao óleo e à manteiga.

    Sinto-me um Zeus.

    Não comer ovo frito
    me causa mais depressão
    do que a certeza da morte.

    Minha tristeza é suspensa
    no momento mágico em que 
    sento na mesa 
    e tomo café com leite quentinho
    e como torrada 
    e ovo frito.

     Depois da xícara vazia,
     do prato sujo, aí sim, 
     podem me dar 
     outro tapa na cara.

terça-feira, 6 de maio de 2014

O HOMEM QUE CRIOU DARTH VADER

O ilustrador  e artista conceitual Ralph McQuarrie (1929-2012) é, depois de George Lucas, a pessoa mais importante para a criação de Star Wars.

Foi o próprio Lucas quem disse: "Ralph McQuarrie foi a primeira pessoa que eu contratei para me ajudar a vislumbrar Star Wars. Sua genial contribuição, na forma de suas inigualáveis artes de produção, impulsionaram e inspiraram todo o elenco e a equipe da trilogia original. Quando as palavras não conseguiam expressar minhas ideias, eu sempre podia apontar para uma das fabulosas ilustrações de Ralph e dizer 'Faça desse jeito´".

A partir do roteiro original, McQuarrie deu vida a personagens como Chewbacca, R2-D2, C-3PO e Darth Vader. Foi dele a ideia de Vader usar o respirador. Além de conceitos para muitos sets de filmagem.

McQuarrie ainda trabalhou em Contatos Imediatos do Terceiro Grau, E.T., Os Caçadores da Arca Perdida e Cocoon, pelo qual ganhou um Oscar.